segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Para Alda, com saudade



 Essas são as flores que quero dar a Alda neste dia.  Vai com Deus, amiga!  Descanse em paz!

Quando penso na Alda, me vem à lembrança uma grande árvore, carregada de folhas e frutos.  É assim que gosto de imaginá-la.  Alda era protetora, cuidava para que não faltasse nada aos seus e, muitas vezes, chegava às raias do exagero.  Amava profundamente sua família, mas demonstrava seu afeto de modo peculiar - com rispidez, muitas vezes. Talvez não soubesse expressar seu amor em palavras.  O que sabemos das pessoas, mesmo daquelas com as quais convivemos ou conhecemos há tantos anos?  Elas são sempre um mistério insondável.  

O que sei de Alda é que ela se sacrificava para dar o melhor à família e esse melhor se traduzia em presentes, conforto e amenidades. Não sabia expressar carinho, amor, afeição.  Era terrivelmente timida, embora aparentasse o contrário.  Era também muito severa e crítica, mas este era o seu jeito de amar.  Foi isso, talvez, o que lhe ensinaram ou o que aprendeu com a vida.

Tenho muitas lembranças dos muitos anos em que fomos amigas.  Algumas até engraçadas, como da vez em que ela insistiu em ir à minha casa conhecer minha família.  Alda era assim: queria saber com quem o irmão estava se metendo e nada mais apropriado do que conhecer a família da pretendente.  Lá fomos nós.  Eu estava pouco à vontade, porque minha família é o que se chama hoje em dia de disfuncional.  Fora isso, eu morava numa casa modesta e de aspecto feio, o que me envergonhava.  Quando nos aproximávamos da minha casa, Alda apontou-a, perguntando: "Quem será que mora naquela casa horrorosa e mal-assombrada?"

Outra lembrança divertida, entre as muitas, foi de uma vez que fomos passar uma temporada em Poços de Caldas.  Ficamos hospedadas com as freiras, que nos incentivaram a ir a um evento na cidade.  Argumentamos que não tínhamos traje apropriado, pois era um acontecimento em grande estilo.  Mas as freiras derrubaram nossas objeções e lá fomos nós.  Foi só entrar para percebermos que todos estavam vestidos com roupas muito chiques de festa, enquanto nossos trajes, por melhores que fossem, não eram minimamente adequados àquele evento.  Olhamos uma para outra e tivemos uma crise de riso tal que fomos forçadas a esconder-nos em algum canto. 

Acho que conheci Alda muito mais que a família dela.  Ela me fazia confidências e, por isso, sei das muitas maldades que lhe fizeram quando esteve internada em um hospital nos Alpes, ainda criança.  Essa experiência a marcou profundamente.  Sabia dos seus medos e suas dúvidas.  E, uma vez, quando seus filhos ainda eram muito pequenos, ela me disse que eu era a única pessoa a quem podia confiá-los, caso alguma coisa lhe acontecesse.  Tal era a nossa proximidade.

Tivemos várias discussões, brigas e chegamos até a ficar sem nos falar durante um tempo.  Em uma das últimas vezes em que conversamos, chegamos a discutir, porque ela enfrentava um problema terrível e eu queria que ela se salvasse, que fosse menos protetora, menos árvore frondosa, que pensasse mais em si mesma.  Mas ela não me ouviu e mergulhou na inconsciência e, depois, no aniquilamento físico.  A família sempre foi mais forte e isso custou-lhe a vida.

Para você, Alda, que foi uma pessoa tão especial, mando meu abraço, meu carinho e todo o meu amor.  Que você encontre a felicidade que tanto buscou na Terra na outra dimensão.  Adeus, amiga!

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Ich bin von Kopf bis Fuss auf liebe eingestellt


Ich bin von Kopf bis Fuß
Auf Liebe eingestellt,
Denn das ist meine Welt.
Und sonst gar nichts.
Das ist, was soll ich machen,
Meine Natur,
Ich kann halt lieben nur
Und sonst gar nichts.

Ela vai logo avisando e não deixa dúvidas: "Da cabeça aos pés, sou feita para o amor.  É minha natureza e nada posso fazer."   Ele ouve embevecido e passa ao largo do aviso.  Vai ter início o duelo entre Eros e Thanatos.

Ele entrega-se da cabeça aos pés à sedutora que vai destruí-lo, esmagá-lo até reduzi-lo ao nada.  Mas nada disso importa, desde que ele esteja ao lado desse anjo de mulher, por quem nutre uma paixão avassaladora.  A solidão foi lentamente preparando este homem para o aniquilamento.  Ele vai desprezar tudo o que chamam de respeito, dignidade, amor próprio para se entregar à deusa que lhe acena com a promessa de uma paixão intensa.  E caminha rumo à destruição total.

Esta é, em síntese, a sinopse da obra prima cinematográfica "Der Blaue Engel - O Anjo Azul", do diretor alemão Josef von Sternberg, baseada no romance de Heinrich Mann "Professor Unrat" - Mann usa, ironicamente, a palava "unrat" (lixo, em alemão) para sobrenome do professor -, tendo como protagonistas Marlene Dietrich (como a sedutora Lola Lola) e Emil Jannings (como o professor Immanuel Rath). 

E este é também o tema de "Passione", em que Mariana Ximenes (estupenda como Clara) revive o Anjo Azul, seduzindo inapelavelmente Totó (Toni Ramos).  Ele sabe que ela não o ama, que quer destrui-lo, mas nada disso lhe importa.  A solidão tornou-o faminto de afeto, carinho, amor.  Mas também o fez ficar cego, surdo e mudo.  Todos os seus sentidos se concentram na paixão avassaladora que sente por Clara.

Na fusão narcísica da paixão, o mundo desaparece.  O sujeito para a ser o mundo e o mundo é a extensão dele.  É o narcisismo primário a que Freud se referia, em que o apaixonado deseja formar um todo indissolúvel com o objeto do seu amor.

A diferença entre "O Anjo Azul" e "Passione" é que, como folhetim e tendo uma audiência que não vai aceitar a destruiçao do protagonista, Totó certamente será salvo.  E isso já está acontecendo.  Ele já conheceu outro Anjo, também de doces olhos azuis, que vai resgatá-lo das garras de Clara e lhe mostrar o caminho do amor. 

E este é, para mim, o grande abismo entre cinema e TV.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Naughty pig

Minha filha me contava, em conversa pelo Skype, o susto que ela e o marido levaram quando, no meio da noite, ouviram um coinc, coinc, coinc.  Acordaram e ficaram conjeturando o que poderia ser aquilo.  O ruído vinha do quarto do meu netinho e eles foram para lá.  Encontraram, finalmente, o culpado daquela situação: era um porquinho que, mesmo tendo sido surpreendido na travessura, continuou com o coinc, coinc, coinc.  Tiveram de levá-lo para outro aposento para continuarem o sono.  O netinho chama esse porquinho, e com razão, de "naughty pig".


Essa história me fez lembrar o que me aconteceu há alguns anos quando fui à Argentina.  Antes de viajar, conversei com o porteiro, sr. Vitor, que sempre quebrava meus galhos, desde problemas de luz até um dinheirinho trocado.  Pois bem, querendo agradar ao Sr. Vitor perguntei se ele gostaria que eu trouxesse alguma coisa da viagem.  Ele foi categórico: quero um relógio de pulso despertador.  Oh, boy! 


Um dia, passeando na Florida, vi uma loja que tinha relógios até na calçada.  E foi lá que encontrei o tal objeto do desejo do sr. Vitor, que despertava ao som de um galo cantando cocorococó.  Comprei-o, aliviada. 

No dia seguinte, pela manhã, Horacio me perguntou se eu havia comprado um relógio de "gallo" (que os argentinos pronunciam gajo).  Foi então que soube da história.  Ele havia acordado no meio da noite com o galo cantando e não conseguia descobrir de onde vinha o canto.  Olhou pela janela, debaixo da cama, até que, apurando o ouvido, descobriu que vinha da minha mala.  E a mala estava bem do meu lado.  Ou seja, aquele relógio nunca serviria para mim.  E Horacio mal conseguia disfarçar o desgosto de ter perdido o sono no meio da noite.  Eu ria às gargalhadas e ele acabou se descontraindo.

Entreguei o presente ao sr. Vitor que, como homem da roça, adorou saber que despertaria ao som de um galo.  E lá se foi sr. Vitor viajar de avião para a terra de seus parentes com o relógio no pulso.  Enquanto estava à bordo, o relógio, sabe-se lá por que razão, disparou e o galo cantou sem parar cocorococó, para desconforto do porteiro, porque os passageiros que estavam ao redor o encaravam irritados, logo que descobriam que o barulho partia de onde ele estava.  Acuado, sr. Vitor se levantou, foi ao banheiro da aeronave e lá mesmo deu fim àquele galo inoportuno.  Botou o relógio no chão e o pisoteou até o galo se calar.

domingo, 22 de agosto de 2010

Para Luciana, com amor

Hoje, vou escrever para a filha que não me lê.  Ela não curte blogs.  Mas mesmo assim vou deixar registrado meu amor por ela.

Luciana chegou na minha vida de surpresa.  Eu  não a esperava e até tentava evitar outra gravidez.  Mas ela veio e foi muito bem-vinda.  Estava sendo aguardada para setembro, mas por razões que não cabe contar aqui, chegou mesmo no dia 22 de agosto.  Tinha de ser leonina.  E ela tem todas as características do signo: é vaidosa, muitíssimo generosa e fantasiosa também.

Foi com grande emoção que recebi em meus braços aquele pedacinho de gente.  Não foi fácil cuidar dela nos primeiros meses.  Ela havia contraído uma bactéria (hoje sei que foi hospitalar) e teve de tomar injeções para ficar boa.  Era tão espertinha minha Luciana que, ainda bebezinho, abria o maior berreiro assim que eu entrava na farmácia com ela.  A danadinha sabia que ia tomar injeção e armava seu barraco.

Passada essa fase ruim, Lu, como eu a chamo, não me deu mais trabalho.  Era muito engraçada aos 5, 6 anos, porque trocava as palavras.  Uma vez, abriu o maior berreiro porque queria um suspensório que estava na moda, e gritava: "eu quero um consultório!"  Um dia, depois de olhar um livro sobre o corpo humano e receber esclarecimentos sobre cada órgão, passou a usá-los em seu vocabulário.  E saía com coisas como: "Patricia me deu um empurrão e eu bati com o pulmão na parede", "Patricia beliscou meu estôngamo."

Cresceu e se tornou popular.  Sempre fez muitos amigos e sempre foi muito querida.  Não pude dar a ela tudo o que merecia, porque eu tinha de dividir tudo por três, para que cada uma recebesse sua parte.  Também tinha de me dividir por três e, inúmeras vezes, a carga foi pesada demais para mim.  Mas Deus ajudou e eu consegui. 

Com ela fui à Rússia e, juntas, desfrutamos uma viagem inesquecível.  Quando chegamos a Moscou, Lu se deslumbrou com a Catedral de São Basílio.  Em São Petersburgo, Lu não se cansava de me perguntar: "Mãe, existe cidade mais bonita do que esta no mundo?"  Hoje, digo com toda certeza que não.  Porque estávamos juntas e felizes.

Hoje, estou aqui prestando essa homenagem a minha querida filha, que mora longe e de quem sinto muita saudade.  Quero dizer, filha, mesmo que você não me leia, que te amo de todo coração e que tudo o que desejo nesta vida é a sua felicidade.  Feliz aniversário, filha, e que Deus abençoe você.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

O Corpo como Metáfora - O corpo aprisionado

“Nenhum animal transforma voluntariamente, como o homem, o seu próprio corpo: extraindo os dentes, amputando os membros, perfurando os órgãos, derramando o sangue, deformando o crânio”
("Tabu do Corpo", José Carlos Rodrigues)



Os séculos XII e XIII privilegiavam a magreza e a verticalidade. A roupa, bem colada ao corpo e talhada de maneira a alongar a silhueta, faziam as mulheres se assemelharem às finas colunas góticas. O fim da Idade Média libera as amarras do corpo: ombros, cabelos e parte dos seios podiam ser mostrados. No século XV, porém, uma espécie de colete muito justo voltava a comprimir o busto. A ênfase do vestuário concentrou-se no ventre, que devia ser proeminente e evocar a fertilidade. Para alcançar esse efeito, as mulheres usavam uma bolsa estofada sob a roupa.


No final do Renascimento, as roupas eram escuras e rígidas. Os seios espremidos, os quadris apagados, os ventres salientes e as linhas sinuosas da Idade Média deram lugar à roupa folgada, que escondia a silhueta. A vestimenta devia salientar a retidão, a altivez, as qualidades da alma. Era uma época de incertezas e turbulências provocadas pelas tensões religiosas entre católicos e protestantes. Na era elizabetana, o corpo feminino estava totalmente coberto. A substância predominava sobre a matéria. Esse estilo prevaleceu até meados do século XVII (período Barroco).

O início do século XVIII trouxe um certo relaxamento ao corpo. As roupas pesadas, o colarinho duro e os babados do Barroco cederam lugar às roupas que acompanhavam as linhas do corpo, dando destaque à suavidade, beleza e ao aspecto delicado. O período neoclássico marcou a volta da simplicidade do traje e o conforto passou a predominar sobre a ostentação. Na virada do século XIX, a moda feminina voltou ao estilo de alguns séculos atrás. Na época de Jane Austen, o traje feminino evocava lembranças dos séculos XVI e XVII.

Nos primórdios do século XX, o corpo bem nutrido e carnudo evidenciava abundância e prosperidade material. A estética da época privilegiava a textura, a tangibilidade e a massa. Substância e textura eram características da moda feminina: bonecas francesas, em versão miniaturizada, vestiam o último lançamento da haute couture. Cada dobradura do tecido, cada enfeite, cada aspecto que compunha a sua confecção eram um tributo à tangibilidade.

Por volta de 1920, porém, um aspecto mais moderno sugeria a transmigração da matéria, a libertação da substância de sua forma. Desde a década de 60 o corpo ideal vem cada vez mais se afinando: as curvas voluptuosas de Marilyn Monroe foram-se achatando até chegarem ao corpo retilíneo, quase etéreo, de Twiggy. Em 1979, Raymond Loewy, um dos maiores designers industriais, observava a tendência do ultra-esbelto também na arquitetura automobilística e introduziu o intaglio (superfície comprimida) na confecção do Starliner, da Studebaker. Ao final da obra, comentou o resultado: “quis dar ao Starliner um aspecto magro e faminto".

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

O Corpo como Metáfora - Padrões de Beleza

As imagens que mostro a seguir foram tiradas pelo fotógrafo alemão Hans Sylvester (Ethiopia-People of the Omo Valley-prêmio Livro do Ano em Fotografia, Paris, 2006) às margens do Rio Omo, na Áfriica.  O Rio Omo atravessa o Sudão, a Etiópia e o Quênia.  Foi nas suas margens que os arqueólogos encontraram o "Homem de Kibish", um ancestral de 12.000 anos.



Nessa região habitam algumas tribos que ainda estão na pré-história: Dassanech, Mursi, Hamar, Karo, Bume e Beshadar.

O vale do Rift - onde se encontra a grande fenda africana que separa geograficamente os negros dos árabes - é uma região vulcânica que fornece uma grande variedade de pigmentos multicoloridos.  Com esses pigmentos - alguns raros - as tribos do Rio Omo praticam sua arte.

No conceito ocidental, são verdadeiros gênios da pintura, pois os traços lembram muito a arte contemporânea de Picasso, Miró, Paul Klee e Taples. 

Em poucos minutos, com uma rapidez impressionante, decoram rosto, torsos, seios, pernas e pés.  Não usam pincéis, apenas uma habilidade fantástica com a ponta dos dedos.

É uma arte ancestral praticada por todos da tribos: crianças, jovens, adultos e idosos.  O aprendizado se dá apenas na observação.  Eles se integram à Natureza, fazendo parte dela, sendo como ela.


A arte é explicada por ela mesma.  Não há explicação.  Não há teoria.  Por isso, é arte no mais alto grau de pureza.  São motivados apenas pelo desejo de ser belos, de seduzir, de exteriorizar o prazer.

(texto extraído de um documento que recebi sobre o assunto)

domingo, 15 de agosto de 2010

A NATUREZA DÁ SHOW

Esta semana, a Natureza deu um presente para o mundo: uma chuva de meteoros que tem sido observada há cerca de 2.000 anos.  Meteoros são restos de um cometa e este vem da Constelação de Perseus. Alguns católicos referem-se a essa chuva de meteoros como "as lágrimas de São Lourenço", porque o dia 10 de agosto marca a data em que o santo foi martirizado.

Assistam ao espetáculo da natureza.


domingo, 8 de agosto de 2010

Floresta de Bétulas

Esta foto de Sergei Karpukhin para a Reuters foi tirada no dia 30 de julho nas cercanias de Voronezh.  Um soldado russo atravessa uma floresta de bétulas devastada por um dos 700 incêndios que devoraram mais de 1000km2 de florestas no pior verão russo dos últimos 130 anos.

Meu coração sangra com essa foto e eu me lembro dos romances de Dostoiévski e Tolstoi, que li quando menina.  Enquanto lia, imaginava a mim mesma passeando pelas florestas de bétulas tão comuns no solo russo e tão bem descritas.  Ao viajar para aquele país, quis conhecer essas florestas, que ficam bem perto de Moscou, e tive ainda a felicidade de ver os perfumadíssimos lírios do vale, cujas florezinhas se assemelham a sinos.  Quem me acompanhou na viagem à Rússia (que, por preguiça, ainda não conclui), verá que num dos posts pus uma foto dessa flor, símbolo da Rússia.

E agora me entristeço e choro ao pensar que os incêndios devem ter exterminado essa flor tão delicada, matado animaizinhos e devastado essas árvores grandes e esguias, de tronco esbanquiçado.  Faço um minuto de silêncio em honra desses mártires.

Choro agora, mas me consolo porque sei que a floresta vai se recuperar, os lírios vão brotar e, quando a floresta voltar a ser o que era, os animaizinhos regressarão ao seu habitat.  Em Chernobyl, pensava-se que o desastre nuclear destruiria a vegetação para sempre, mas não foi isso o que aconteceu.  Para surpresa geral, o mato e até as flores invadiram a usina atômica abandonada, apoderando-se do que, por direito legítimo, pertence à natureza.  E ela é muito mais forte que o homem.

Quando estive em Belém, há alguns anos, o que mais me impressionou foi testemunhar a força da natureza.  Era perceptível o vigor da floresta mesmo estando coberta pelo asfalto das ruas e estradas.  Pequenas, mas ameaçadoras rachaduras não deixavam dúvida - era a natureza lutando para se reerguer.  Um só vacilo e a floresta se regenera, voltando ao seu antigo esplendor.  E é isso que me consola quando ouço, com horror, falar das queimadas, das derrubadas de árvores.  De uma coisa tenho absoluta certeza: nós passamos, a natureza fica, porque é eterna.


sábado, 7 de agosto de 2010

O anel que tu me deste....

.... era vidro e se quebrou; o amor que tu me tinhas era pouco e se acabou.  Esta é uma das minhas cirandas preferidas.  Hoje em dia, vejo a sabedoria de cada uma dessas palavras, quando me relaciono com algumas pessoas. 

Como a maioria, costumo idealizar.  Conheço uma pessoa superficialmente e acho que já sei quem ela é.  O pior é que tenho uma certeza instantânea.  Mesmo recebendo avisos, ouvindo sábios conselhos de gente querida, não faço caso. Conheço e pronto.  E nós sabemos que não é bem assim.  Leva-se anos para conhecer alguém... mais ou menos.  Sim, porque somos seres surpreendentes.

Hoje estou num dia nostálgico e triste.  Desfiz uma amizade que nunca foi, na verdade, amizade.  Foi uma dessas idealizações minhas.  Achei que conhecia, que tinha conquistado uma amiga e tanto.  Eu a idealizei durante alguns anos.  Achava que era uma amiga sensível e inteligente, dessas que a gente pode contar segredos, falar dos medos e incertezas, porque ela sempre estará lá.  Ela, por sua vez, também iria fazer confidências e a gente se conheceria profundamente.  Não foi assim.  Quando penso em amizade, imagino um lugar sereno, à beira de um rio, onde a gente estende a rede e descansa tranquilamente.

A pessoa de quem deixei de ser amiga e que julgava sensível e inteligente era, infelizmente, insensível e de uma burrice emocional impressionante.  É uma pessoa rancorosa, amargurada e triste.  Como todas as pessoas que não viveram a vida em sua plenitude, é uma pessoa infeliz e só.  Teve, como todo mundo, sua oportunidade de brilhar, de voar, de conhecer lugares, pessoas, amar de verdade, mas teve medo.  Se entocou.  Viveu escondida, sentindo que assim estaria segura.  Mas o tempo passou e lhe cobrou um balanço de vida.  O que fizera durante todos aqueles anos?  Ela havia feito muitas coisas boas, mas não teve o bom senso de apreciá-las.  Sempre se julgou menor, inferior.  Em vez de pensar nas conquistas, ainda que não tivesse chegado a todas, queixava-se do que não teve forças para conquistar.  Vive agora em busca do tempo perdido, como se pudesse voltar atrás.  Não pode e sabe que não pode.  O resultado é que sobra amargura para todo lado.  Uma pessoa assim não pode e não consegue ser amiga de ninguém.  No entanto, uma amizade lhe faria bem.

Eu sigo o meu caminho.  Estou mais aliviada agora que pude expressar o que sinto.  Não sou de voltar atrás.  Estou sempre indo adiante.  Tentei de todas as maneiras salvar a amizade, mas uma andorinha só não faz verão.  Perdi a amiga, mas estou inteira... e feliz.. como sempre.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Aurora Boreal


A Aurora Boreal foi fotografada do espaço no domingo, 1 de agosto.  Daí partiu o aviso: ela volta a aparecer na quarta.  Não deu outra.








Ela apareceu na quarta-feira, na Noruega.
Não vou falar muito, porque uma imagem vale
mais que mil palavras.





















Eu deveria escrever a última parte de "O Corpo como Metáfora", mas este evento fascinante se interpôs. A Aurora Boreal que,caprichosa, costuma aparecer quando bem entende, resolveu dar seu segundo show neste ano. E não posso deixar de mostrar as fotos belíssimas que foram tiradas durante esta semana.

Estão dizendo que ela vai aparecer com mais frequência nos próximos anos. Tomara! É minha chance, quem sabe?, de vê-la finalmente.

Desfrutem, como eu desfrutei.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

O Corpo como Metáfora - Padrões de Beleza

"Na cera mole dos corpos, cada sociedade deixa sua marca." (Philippe Perrot)

Olhe a figura ao lado e diga o que acha?  Você consideraria essa estátua como representativa de um padrão de beleza?  Acho que não.  Trata-se da Vênus de Willendorf ou a Mulher de Willendorf, uma escultura descoberta no sítio arqueológico do paleolítico situado perto de Willendorf, na Áustria.  Mede um pouco mais de 11cm e estima-se que tenha sido esculpida há 22 ou 24 mil  anos.  Era o padrão de beleza da época.  Se nos basearmos nos livros, vamos lembrar que nem sempre foi fácil conseguir o alimento.  Pode-se, portanto, imaginar que as pessoas que viveram nesse período eram magras, famintas e que talvez idealizassem um corpo opulento, de formas arredondadas como esse, não é mesmo?  É uma hipótese com grandes chances de ser verdadeira.

Vamos pular para a Idade Média, precisamente para o século XIV, quando a peste bubônica invadiu a Europa, matando um terço da população.  Trazida nos porões dos navios que vinham do Oriente, a epidemia não poupou ninguém: morreram reis, príncipes, senhores feudais, servos, padres - era pegar a doença e morrer, pois não havia cura.  Havia, sim, preconceito.   E este era tão grande que os doentes eram, muitas vezes, abandonados pela própria família nas florestas ou em locais afastados. A doença foi sendo controlada no final do século XIV, com a adoção de medidas higiênicas nas cidades medievais.

Agora olhe a foto ao lado.  É a obra mais famosa do pintor flamengo Jan van Eyck.  Você vai imaginar que se trata de um casal à espera do filho, não é mesmo?  Pois vou lhe dizer que está enganado.  A pintura foi feita no dia do casamento do rico comerciante Giovanni Arnolfini e sua mulher Giovanna Cenami.  Por quê a barriga de Giovanna?  Porque era moda.  Era preciso estimular o nascimento de bebês para repovoar a Europa e dai a moda da barriga postiça.  Era in usar bolsinhas por baixo do vestido para simular uma gravidez. 

Desde o fim da antiguidade greco-romana, a moda parecia ter como objetivo essencial esconder as formas por meio de faixas comprimindo os seios e de roupas amplas. A roupa era igual para homens e mulheres.  Mas ao longo dos séculos XII e XIII, as roupas foram usadas para acentuar a silhueta.

Veja como era descrita a moda do século XV (a pintura ao lado é desse século):  “o vestuário feminino é igualmente ajustado e exalta os atributos da feminilidade: o traje alonga o corpo através da cauda, põe em evidência o busto, os quadris, a curva das ancas. O peito é destacado pelo decote; o próprio ventre [...] é sublinhado por saquinhos proeminentes escondidos sob o vestido”. E ainda “...as mangas possuíam longas fitas ou palatinas que às vezes se arrastavam no chão”.  Tudo isso está evidenciado no célebre quadro de Jan van Eyck.

Em outro post, falarei mais sobre o assunto.  Até lá.

domingo, 1 de agosto de 2010

O Corpo como Metáfora


Ultimamente, não tenho tido muito tempo para assistir à TV, mas, de vez em quando, vejo parte de algum programa só para ficar antenada.  Não sei se as pessoas reparam ou se dão conta, mas a mídia controla o nosso corpo.  Um dia desses, sintonizei o canal líder de audiência.  Vi duas artistas muito muito conhecidas, uma delas dizendo à outra, a título de elogio supremo: "Mas como você está magrinha!!!"  Estava mesmo.  A moça estava no osso - não havia mais o que emagrecer.  No entanto, é provável que ela não esteja ainda satisfeita com seu corpo, e nada impede que, a exemplo da Demi Moore, adote uma dieta extrema, à base de suco de limão e mel, para emagrecer.  A estética atual é de aniquilamento do corpo, de desprezo ao alimento, especialmente os calóricos.  Não é, pois, de se admirar que haja tantos bulímicos por aí.

No canal a cabo, uma personagem também conhecida se refere à colega como "magérrima" - elogio máximo.  Dia desses, também no canal a cabo, vi um documentário em que médicos de prestigio em suas especialidades examinavam pessoas que haviam escolhido e se submetido a dietas supostamente saudáveis.  Um caso especial me chamou a atenção. Era o de um homem muito magro, que adotou a dieta anti-envelhecimento das células.  Segundo essa dieta, deve-se ingerir pouca comida, para não sobrecarregar as células, e a consequência é o retardamento do envelhecimento.  Após uma bateria de testes, o médico disse a esse homem que ele estava correndo perigo de vida e o aconselhou, alarmado, a COMER.  Pois é, comer - essa coisa simples que nos mantém vivos e que parece ter virado o horror de muita gente.  Vejam só.

Imagino que as pessoas que adotam dietas extremas fiquem indignadas com tal conselho, que vem na contramão dos seus hábitos modernos.  Que história é essa de comer?  Comer engorda e ser gordo é ser out.  O gordo nunca sofreu tanto como agora.  E até mesmo o rótulo de gordo já não é o de antigamente.  Passou de certo manequim, que, aliás, encolheu uma barbaridade, a pessoa já pode se considerar gorda.  Está condenada ao opróbio, ao ostracismo.  É, enfim, um ser abjeto.  Marilyn Monroe, que enlouqueceu tantos homens, seria hoje chamada de gorda.  Que mundo insensato, não lhe parece? 

E, no entanto, as pessoas parecem não refletir sobre essas questões.  Abraçam qualquer modismo para fazer parte de uma tribo.  Todos querem pertencer ao grupo.  Ficar fora dele é perigoso.  O mundo avançou, mas ainda temos as mesmas fobias dos primórdios da civilização.  Nossa inteligência emocional parece não ter acompanhado o avanço da ciência em todos esses séculos.  Em nosso íntimo, não passamos de pobres criaturas indefesas, a despeito de mostrarmos poder e ambição nas fotos publicadas pela mídia.  A mesma mídia que, arbitrariamente, controla nosso corpo e determina nossos hábitos. 

Mas culpar só a mídia seria injusto.  Muito antes de ela existir nosso corpo já era controlado.  E como era feito esse controle?  Por que ele sempre existiu?  Para quem e a quem serve?  Bem, sobre isso falarei em outro post.  Até lá.

O CLIMA DO ANO

Há tempos venho notando que a natureza absorve nossos humores, mas isso é assunto pra outro post. Lembro que, em 2016, meu pé de amora fic...