Talvez a coisa mais
chocante que li na minha vida - e olha que li um monte de livros sobre
campos de concentração - foram os comentários dirigidos à propaganda
política de Haddad, em que Amelinha, barbaramente torturada pelo
desgraçado do Ustra, descreve em detalhes tudo o que sofreu e conta como
o maníaco ainda levou seus filhos para verem ela e o marido sujos,
ensanguentados e vomitados. A filha pequena, quando a viu, perguntou:
"Mãe, por que você está azul?" Os comentários são terríveis,
monstruosos, inimagináveis: "ela fez por merecer", "santinha é que não
era"... e por aí vai.
A gente sabe que uma parcela da sociedade é formada por monstros, ou tantas desgraças não aconteceriam no mundo. Desde criancinhas nossos pais avisavam para tomar cuidado com estranhos. A gente sabe que a maldade existe. Mas estávamos longe de imaginar que cidadãos comuns, aparentemente do bem - aquela senhora, por exemplo, tão gentil -, fossem monstros. Dói saber que o país tantas vezes exaltado como acolhedor, de gente feliz e amiga não é tão acolhedor e amigo assim (que digam os venezuelanos, haitianos, sírios...). Não, nossa gente não é feliz. A gente até achou que aquelas senhoras de camisa da CBF, portando cartazes, eram apenas ridículas, que aqueles fortões de camisa verde e amarela não eram tão perigosos assim. Mas são, agora sabemos que eles dão medo. E dá medo também sair à rua, dá medo frequentar reuniões sociais, dá medo tentar fazer amigos.
Nunca mais seremos como antes. Da caixa de pandora nem a esperança restou.