quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Os crimes de lavagem da honra: A onda de assassinatos que envergonha o mundo - continuação

Em 2006, autoridades da região curda do sudeste da Anatólia calculavam que, em cada poucas semanas, uma mulher tentava cometer suicídio por imposição da família. Outras eram mortas por apedrejamento,  tiros, enterradas vivas ou estranguladas.

Uma jovem de 17 anos chamada Derya, que se apaixonou por um rapaz na escola, recebeu mensagem de texto de seu tio pelo celular. A mensagem dizia: "Você envergonhou nosso nome. Mate-se e limpe essa vergonha ou nós mesmos vamos matá-la." A tia de Derya havia sido morta pelo avô por motivo idêntico. Seus irmãos também enviaram mensagens de texto, chegando a 15 delas por dia. Derya tentou cumprir o desejo da família. Pulou no rio Tigre, tentou enforcar-se e cortou os pulsos – todas as tentativas foram mal-sucedidas. Acabou fugindo para um abrigo de mulheres.


Levou 13 anos para Murat Kara, de 40 anos, admitir que, em 2007, disparou sete tiros em sua irmã mais nova, depois que sua mãe viúva e os tios ordenaram que a matasse por ela ter fugido com o namorado. Antes de assassinar a irmã na cidade curda de Dyabakir, os vizinhos recusavam-se a conversar com Murat Kara e o imã havia dito que estava desobedecendo a palavra de Deus por não matar a irmã. Tornou-se, então, um assassino. Restaurou a honra.

Em seu livro “In The Grip of Tribal Customs” (Reféns de Costumes Tribais), um jornalista turco, Mehmet Farac, registra mortes em nome da “honra” de cinco meninas, na década de 1990, na província de Sanliurfa. Duas delas - uma tinha apenas 12 anos - tiveram as gargantas cortadas em praças públicas, duas outras foram atropeladas por tratores e a quinta, morta por seu irmão mais novo. Uma das mulheres que tiveram a garganta cortada chamava-se Sevda Gok. Seus irmãos seguraram-lhe os braços enquanto o primo adolescente cortava-lhe a garganta.

Mas a matança de mulheres em nome da "honra" não é um crime exclusivamente curdo, ainda que praticado em áreas rurais do país. Em 2001, Sait Kina esfaqueou a filha de 13 anos até a morte, por ter conversado com meninos na rua. Ele atacou-a no banheiro com um machado e uma faca de cozinha. Quando a polícia descobriu o cadáver, a cabeça da menina estava tão mutilada que a família a tinha enrolado em um lenço. Sait Kina disse à polícia: "Cumpri o meu dever."

No mesmo ano, um juiz de Istambul reduziu a sentença de prisão perpétua contra três irmãos para entre quatro a 12 anos, por eles terem matado a irmã, lançando-a de uma ponte, sob a acusação de ser prostituta. O juiz concluiu que o comportamento da moça tinha "provocado" o assassinato.

Há séculos, os exames de virgindade têm sido considerados parte normal da tradição rural, antes do casamento de uma mulher. Em 1998, quando cinco jovens tentaram o suicídio antes da avaliação, o ministro dos Negócios Familiares turco defendeu a obrigatoriedade de exames médicos em meninas que vivem em lares adotivos.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Os crimes de lavagem da honra: A onda de assassinatos que envergonha o mundo - continuação



Um dos mais terríveis assassinatos em 1999 foi o de uma jovem de 16 anos com retardo, Lal Jamilla Mandokhel, que, segundo relatos, foi violada por um funcionário público em Parachinar, província a noroeste da fronteira do Paquistão. Seu tio registrou queixa na polícia, mas entregou Lal à tribo e os anciãos decidiram que ela deveria ser morta para preservar a honra "tribal". Lal foi morta a tiros na frente deles.

Arbab Khatoon foi estuprada por três homens no distrito de Jacobabad. Ela registrou queixa na polícia. Sete horas depois, foi assassinada pelos parentes, que alegaram que ela os "desonrou" ao ter relatado o crime.

Há mais de 10 anos, a Comissão do Paquistão para os Direitos Humanos registrava uma taxa de mil "assassinatos em nome da honra" por ano. Mas se o Paquistão parece ter as piores taxas de crimes de "honra" - e é preciso lembrar que muitos países afirmam falsamente não ter nenhum – a Turquia deve ocupar o segundo lugar.

Segundo a polícia, entre 2000 e 2006, 480 mulheres – 20% delas com idades entre 19 e 25 anos - foram mortas por crimes de "honra" e inimizades. Outra estatística turca, elaborada há mais de cinco anos por grupos de mulheres, sugere que pelo menos 200 meninas e mulheres são assassinadas todos os anos em nome da "honra". Esses números estão atualmente muito subestimados. Muitos aconteceram em áreas curdas do país; uma sondagem concluiu que 37% dos cidadãos de Diyabakir aprovam o assassinato de mulheres que tenham relações extraconjugais. Medine Mehmi, a menina que foi enterrada viva, vivia na cidade curda de Kahta.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Os crimes de lavagem da honra: A onda de assassinatos que envergonha o mundo - continuação

Zakir Hussain Shah cortou a garganta de sua filha Sabiha, 18, em Bara Kau, em junho de 2002, porque ela havia "desonrado" a família. Mas sob a notória lei paquistanesa qisas, o herdeiro tem poderes para perdoar o assassino. Por essa razão, a mãe e o irmão de Sabiha "perdoaram" o pai e ele foi libertado.

Quando um homem matou suas quatro irmãs, em Mardan, no mesmo ano, porque elas queriam uma parte da herança, a mãe o "perdoou", com base na mesma lei. Em Sarghoda, mais ou menos nessa época, um homem disparou contra as mulheres de sua família, matando duas de suas filhas. Mais uma vez, a esposa - e várias outras filhas feridas por ele - "perdoaram" o assassino, porque eram suas herdeiras.

Outro absurdo: o estupro é também usado como punição nos de crimes de lavagem da "honra". Na aldeia de Meerwala, no Punjab, em 2002, um "júri" tribal alegou que um menino de 11 anos da tribo Gujar, Abdul Shakoor, tinha como babá uma mulher de 30 anos da tribo Mastoi - uma "desonra" para este grupo tribal. Os anciãos tribais decidiram que, para "devolver" a honra ao grupo, a irmã do menino, de 18 anos, Mukhtaran Bibi, devia ser estuprada por vários homens. O pai, avisado de que todas as mulheres da família também seriam estupradas se Mukhtar não fosse entregue a eles, levou a filha, respeitosamente, para esse "júri" profano. Quatro homens, um dos quais do "júri", imediatamente arrastaram a moça para uma cabana e a estupraram, enquanto cerca de uma centena de homens riam e aplaudiam do lado de fora. Ela foi então obrigada a andar nua pela aldeia na volta para casa. Levou uma semana até a polícia registrar o crime como uma "reclamação".

Ataques com ácido também fazem parte das punições criminosas em nome da "honra". O Independent deu ampla cobertura, em 2001, a um homem chamado Bilal Karachi Khar, que jogou ácido no rosto de sua mulher Fakhra Yunus, depois que ela o deixou e voltou para a casa da mãe, na área de prostituição da cidade. O ácido fundiu-lhe os lábios, queimou o cabelo, derreteu os seios e uma orelha e transformou-lhe o rosto em uma "borracha derretida".

Naquele mesmo ano, uma mulher de 20 anos, chamada Hafiza, foi alvejada a tiros duas vezes por seu irmão, Asadullah, em frente a uma dúzia de policiais fora de um tribunal de Quetta, por ter-se recusado a seguir a tradição de se casar com o irmão mais velho do marido falecido. Ela casou-se com outro homem, Fayyaz Lua, mas a polícia prendeu a moça e a levou de volta para sua família em Quetta, sob o pretexto de que o casal poderia casar-se formalmente lá. Mas ela foi forçada a registrar queixa de que Fayaz a havia sequestrado e estuprado. Quando Hafiza dirigiu-se ao juiz para queixar-se de que sua declaração fora feita sob pressão e que ela continuava a considerar Fayaz como seu marido, o irmão Asadullah a matou. Ele entregou a arma a um policial que havia presenciado o assassinato.

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domingo, 12 de setembro de 2010

Os crimes de lavagem da honra: A onda de assassinatos que envergonha o mundo - continuação

Ou Aisha Ibrahim Duhulow, 13, que na Somália, em 2008, na frente de mil pessoas, foi arrastada para um buraco no chão - o tempo todo gritando, "Eu não vou - não me mate" – e depois enterrada até o pescoço e apedrejada por 50 homens, culpada de adultério? Passados 10 minutos, tiraram-na do buraco e, estando ela ainda vida, puseram-na de volta e continuaram o apedrejamento. O crime de Aisha? Ela fora estuprada por três homens e, fatalmente, a família decidiu relatar os fatos ao grupo paramilitar Al-Shabab, que controla Kismayo.

Ou o "juiz" islâmico Al-Shabab, no mesmo país, que anunciou em 2009 o apedrejamento e morte de uma mulher - o segundo deste tipo no mesmo ano - por ela ter um amante? O homem recebeu meras 100 chibatadas.

Ou a jovem encontrada em uma vala de esgoto próximo a Daharki, no Paquistão, morta por sua família em nome da "honra" porque deu à luz o segundo filho, tendo o nariz, orelhas e lábios decepados antes de morrer, seu primeiro filho morto entre suas roupas e o corpo do recém-nascido ainda em seu ventre, com a cabeça de fora? Estava em estado de decomposição e a polícia local foi chamada para enterrá-la. Mulheres levaram os três ao túmulo, mas um clérigo muçulmano recusou-se a rezar por ela porque era "irreligioso" cumprir o ritual fúnebre namaz-e-janaza para uma "mulher maldita e seus filhos ilegítimos".

São tão terríveis os detalhes desses "crimes de honra" e tantas são as mulheres assassinadas, que a história de cada uma pode transformar o horror em banalidade. Mas para que esses atos - e os nomes das vítimas, quando pudermos descobri-los – não sejam esquecidos, relatamos os sofrimentos de algumas mulheres nos últimos dez anos, selecionadas ao acaso, país por país, crime por crime.

Em março passado, Munawar Gul matou a tiros a irmã de 20 anos, Saanga, no noroeste de uma província fronteira do Paquistão, e o homem suspeito de ter "relações ilícitas" com ela, Aslam Khan.

Em agosto de 2008, cinco mulheres foram enterradas vivas em nome dos "crimes de honra", no Baluchistão, por homens armados de uma tribo; três delas - Hameeda, Raheema e Fauzia - eram adolescentes que, depois de serem espancadas e mortas a tiro, foram jogadas vivas em uma vala e depois cobertas com pedras e terra. Quando duas mulheres mais velhas, de 45 e 38 anos, protestaram, sofreram o mesmo destino. As três mulheres jovens tinham tentado escolher seus próprios maridos.

No parlamento paquistanês, o senador Israrullah Zehri refere-se a esses assassinatos como uma "tradição secular" que ele "continuará a defender".

Em dezembro de 2003, uma mulher de 23 anos, em Multan, identificada apenas como Afsheen, foi assassinada por seu pai porque, depois de um casamento arranjado infeliz, ela fugiu com um homem chamado Hassan, pertencente a uma tribo rival. Afsheen vinha de família educada, composta de funcionários públicos, engenheiros e advogados. "Dei-lhe comprimidos para dormir em uma xícara de chá e depois a estrangulei com uma dapatta [uma longa echarpe, parte da vestimenta tradicional feminina], confessou o pai. Ele disse à polícia: "A honra é a única coisa que um homem tem. Posso ainda ouvir os gritos dela, era minha filha preferida. Quero destruir minhas mãos e acabar com a minha vida." A família havia encontrado Afsheen com Hassan em Rawalpindi e prometera não fazer-lhe nenhum mal se ela voltasse para casa. Estavam mentindo.

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quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Os crimes de lavagem da honra: A onda de assassinatos que envergonha o mundo

Inauguro este post em protesto pelas 20 mil mulheres que são assassinadas a cada ano em nome da "honra". A reportagem de Robert Fisk foi publicada ontem no The Independent.
Acompanhe e faça também seu protesto.
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É um dos últimos grandes tabus: o assassinato de pelo menos 20 mil mulheres por ano em nome da "honra". Mas o problema não está confinado ao Médio Oriente: o contágio se espalha rapidamente.

É uma tragédia, um horror, um crime contra a humanidade. Os pormenores dos assassinatos - das mulheres decapitadas, queimadas e apedrejadas até a morte, esfaqueadas, eletrocutadas, estranguladas e enterradas vivas em nome da “honra” de suas famílias - são tão bárbaros quanto vergonhosos. Muitos grupos de mulheres no Oriente Médio e sudoeste da Ásia suspeitam que o número de vítimas seja pelo menos quatro vezes maior do que a última estimativa anual das Nações Unidas, de cerca de 5 mil mortes por ano. A maioria das vítimas é jovem, muitas adolescentes, massacradas por uma tradição vil que remonta há centenas de anos, mas agora abrange a metade do mundo.

A investigação de 10 meses feita pelo The Independent na Jordânia, Paquistão, Egito, Gaza e Cisjordânia expõe detalhes aterrorizantes de um dos mais repulsivos assassinatos. Os homens também são mortos em nome da "honra" e, embora os jornalistas tenham identificado esses crimes como uma prática de maioria muçulmana, comunidades cristãs e hindus também os cometem. Na verdade, a lavagem da "honra" (ou ird) das famílias, comunidades e tribos transcende a religião e a compaixão humana. Grupos voluntários de mulheres, organizações de direitos humanos, a Anistia Internacional e arquivos de notícias sugerem que a matança de inocentes por motivo de "desonra" de suas famílias vem aumentando a cada ano.

Os curdos iraquianos, os palestinos da Jordânia, o Paquistão e a Turquia parecem ser os piores praticantes de tais crimes, mas a imprensa nesses países é regiamente compensada para manter o sigilo que rodeia os "assassinatos de honra" no Egito - que afirma mentirosamente não haver nenhum - e outras nações do Oriente Médio no Golfo e no Levante (região mediterrânea entre a Turquia e o Egito). Mas os crimes de honra há muito tempo se espalharam pela Grã-Bretanha, Bélgica, Rússia, Canadá e muitas outras nações. Autoridades de segurança e juízes de grande parte do Oriente Médio são coniventes em reduzir ou revogar penas de prisão para famílias acusadas de assassinato de mulheres, classificando esses crimes, muitas vezes, como suicídios, no intuito de evitar processos judiciais.

É difícil permanecer insensível diante do vasto e detalhado catálogo de tais crimes. Como reagir a um homem - isso aconteceu tanto na Jordânia quanto no Egito - que estupra a própria filha e depois, quando ela engravida, a mata para salvar a "honra" de sua família? Ou o pai turco e avô de uma menina de 16 anos, Medine Mehmi, na província de Adiyaman, que a entrerrou viva debaixo de um galinheiro, em fevereiro, por “fazer amizade com meninos”? O corpo de Medine foi encontrado 40 dias depois, sentado e com as mãos amarradas.
 
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sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Nasceu Noah!!!!


Depois de muita tristeza, chegou Noah  para enxugar nossas lágrimas e fazer nossos corações ficarem alegres novamente.  É um menino abençoado.  Nasceu num dia de sol esplendoroso e muita luz.  Foi aguardado ansiosamente e recebido com muito carinho.

Seja bem-vindo, meu querido Noah e saiba que nós amamos você de todo coração. 

O CLIMA DO ANO

Há tempos venho notando que a natureza absorve nossos humores, mas isso é assunto pra outro post. Lembro que, em 2016, meu pé de amora fic...