domingo, 20 de março de 2011

Japão: O triunfo do espírito



Gostei tanto da matéria do The Independent que decidi traduzi-la para quem se interessar.


O Japão sobreviveu aos horrores de Hiroshima. Reconstruiu-se após o pesadelo de Kobe. Quando os passageiros do metrô foram atacados na hora do rush, o transporte foi rapidamente retomado. Robert Twigger saúda a determinação de uma nação.

Quarta - feira, 16 de março de 2011
 
Em meados da década de 1990, na época do terremoto de Kobe e do ataque com gás nervoso sarin no metrô de Tóquio, eu vivia há vários anos na capital japonesa. Passei a maior parte do tempo treinando artes marciais tradicionais.

Uma pessoa acabara de morrer no dojo onde eu treinava. Um aluno, um homem mais velho, de atitude tipicamente genki - um conceito exclusivamente japonês que significa entusiasmo, diversão, animação - fora, durante o treinamento, atirado à esteira repetidas vezes, durante uma hora. Ele se queixou de dor de cabeça, mas continuou o exercício. Finalmente, conseguiu se levantar e minutos depois estava morto - sofrera uma hemorragia cerebral. Que ele tenha continuado a se exercitar, apesar da dor, é uma atitude característica  predominante no dojo. O aspecto incomum da morte do artista marcial, para mim, foi que sua esposa não reclamou ou moveu uma ação por perdas e danos. Ao invés disso, ela expressou seu contentamento por ele ter morrido fazendo algo que realmente amava. Estamos familiarizados, no Ocidente, com cenas exageradas de luto. Não no Japão. 

Em todas os aspectos da vida, o japonês exalta, de modo alegre mas determinado, o konjo, ou a "coragem". Ser corajoso é visto como norma, e não exceção. Quando eu trabalhava em Tóquio, como professor, telefonei uma vez para dizer que estava com febre de 40 graus. Pediram-me para ir trabalhar de qualquer jeito. (Não fui, mas o fato de que tenham me pedido para ir diz alguma coisa.) 

A tragédia que ora desaba sobre o Japão pode apequenar qualquer avaliação batida da capacidade do país de se recuperar; no entanto, qualquer pessoa que conheça o Japão e sua história dirá: os japoneses são diferentes. A capacidade desse povo de superar desastres está profundamente enraizada nas religiões nacionais xintoísta e budista - em especial na variante Zen desta última -, bem como em conceitos não-tradicionais como yamato-damashii, ou "espírito japonês". 

O Zen não é universalmente aprovado no Japão, mas seus conceitos têm permeado todo lado, na arte e na vida. O projeto de mudar a realidade de ser, de não estar ligado ao momento, de dar tudo de si no que faz - tudo isso são conceitos Zen entrelaçados na vida cotidiana japonesa, na forma de encontrar um modo de expressão como, por exemplo, a execução de um trabalho.

Lembro-me de ficar fascinado por um adolescente entediado numa lanchonete em Tóquio, onde costumava ir. Um sujeito tranquilo, ainda na faculdade, o tipo do garoto que na Inglaterra só trabalharia direito se tivesse vontade. Mas lá, cada sanduíche que fazia era exatamente igual, perfeito sob todos os aspectos, do primeiro ao último: ele aprendera o método e continuava simplesmente praticando-o, não considerando, nem por um momento, que podia diminuir seu rendimento ou fazer um trabalho inferior. Esta é uma atitude inteiramente típica. 

Yamato-damashii é um conceito mais rico. Na década de 1930 e durante a Segunda Guerra Mundial, o "espírito japonês" representava a arrogância e o desejo de dominar outros povos de casta inferior. Após a derrota de 1945 (que ecoa assustadoramente em algumas imagens fotográficas do desastre atual), o japonês "mudou verdadeiramente", como eles dizem, e empregou seu espírito indomável na causa da reconstrução do país. Mas a determinação inquebrantável era a mesma. 

Continua no próximo post...

2 comentários:

petloveshaon disse...

MUITO BOM,ADOREI A MATÉRIA!!!!!!

Aurora Boreal disse...

Temos muito que aprender com esse povo, né não?

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