O mundo ficou mais feio, mais triste e sem graça sem ela. Minha homenagem a essa grande atriz e mulher, que teve coragem de viver a sua verdade.
quinta-feira, 24 de março de 2011
domingo, 20 de março de 2011
Japão: O triunfo do espírito
Gostei tanto da matéria do The Independent que decidi traduzi-la para quem se interessar.
O Japão sobreviveu aos horrores de Hiroshima. Reconstruiu-se após o pesadelo de Kobe. Quando os passageiros do metrô foram atacados na hora do rush, o transporte foi rapidamente retomado. Robert Twigger saúda a determinação de uma nação.
Quarta - feira, 16 de março de 2011
Em meados da década de 1990, na época do terremoto de Kobe e do ataque com gás nervoso sarin no metrô de Tóquio, eu vivia há vários anos na capital japonesa. Passei a maior parte do tempo treinando artes marciais tradicionais.
Uma pessoa acabara de morrer no dojo onde eu treinava. Um aluno, um homem mais velho, de atitude tipicamente genki - um conceito exclusivamente japonês que significa entusiasmo, diversão, animação - fora, durante o treinamento, atirado à esteira repetidas vezes, durante uma hora. Ele se queixou de dor de cabeça, mas continuou o exercício. Finalmente, conseguiu se levantar e minutos depois estava morto - sofrera uma hemorragia cerebral. Que ele tenha continuado a se exercitar, apesar da dor, é uma atitude característica predominante no dojo. O aspecto incomum da morte do artista marcial, para mim, foi que sua esposa não reclamou ou moveu uma ação por perdas e danos. Ao invés disso, ela expressou seu contentamento por ele ter morrido fazendo algo que realmente amava. Estamos familiarizados, no Ocidente, com cenas exageradas de luto. Não no Japão.
Em todas os aspectos da vida, o japonês exalta, de modo alegre mas determinado, o konjo, ou a "coragem". Ser corajoso é visto como norma, e não exceção. Quando eu trabalhava em Tóquio, como professor, telefonei uma vez para dizer que estava com febre de 40 graus. Pediram-me para ir trabalhar de qualquer jeito. (Não fui, mas o fato de que tenham me pedido para ir diz alguma coisa.)
A tragédia que ora desaba sobre o Japão pode apequenar qualquer avaliação batida da capacidade do país de se recuperar; no entanto, qualquer pessoa que conheça o Japão e sua história dirá: os japoneses são diferentes. A capacidade desse povo de superar desastres está profundamente enraizada nas religiões nacionais xintoísta e budista - em especial na variante Zen desta última -, bem como em conceitos não-tradicionais como yamato-damashii, ou "espírito japonês".
O Zen não é universalmente aprovado no Japão, mas seus conceitos têm permeado todo lado, na arte e na vida. O projeto de mudar a realidade de ser, de não estar ligado ao momento, de dar tudo de si no que faz - tudo isso são conceitos Zen entrelaçados na vida cotidiana japonesa, na forma de encontrar um modo de expressão como, por exemplo, a execução de um trabalho.
Lembro-me de ficar fascinado por um adolescente entediado numa lanchonete em Tóquio, onde costumava ir. Um sujeito tranquilo, ainda na faculdade, o tipo do garoto que na Inglaterra só trabalharia direito se tivesse vontade. Mas lá, cada sanduíche que fazia era exatamente igual, perfeito sob todos os aspectos, do primeiro ao último: ele aprendera o método e continuava simplesmente praticando-o, não considerando, nem por um momento, que podia diminuir seu rendimento ou fazer um trabalho inferior. Esta é uma atitude inteiramente típica.
Yamato-damashii é um conceito mais rico. Na década de 1930 e durante a Segunda Guerra Mundial, o "espírito japonês" representava a arrogância e o desejo de dominar outros povos de casta inferior. Após a derrota de 1945 (que ecoa assustadoramente em algumas imagens fotográficas do desastre atual), o japonês "mudou verdadeiramente", como eles dizem, e empregou seu espírito indomável na causa da reconstrução do país. Mas a determinação inquebrantável era a mesma.
Continua no próximo post...
sexta-feira, 18 de março de 2011
Está na moda ser devassa?
Uma vez eu embarcava num ônibus com minhas filhas, quando um sujeito passou a nossa frente, quase nos atropelando com suas pisadas e cotoveladas. Passado o susto, comentei ironicamente que os tempos haviam mudado e que os homens já não eram mais cavalheiros. O sujeito ouviu e replicou que "ser cavalheiro" era algo fora de moda. Ser educado, gentil, cavalheiro é estar fora de moda?
Agora, a propaganda, braço direito do regime "capetalista", faz um desfavor às nossas moças: apresenta a caretinha da Sandy dizendo que moderno é ser devassa - marca da cerveja que deve ter-lhe pago uma fortuna para desencaminhar meninas bobinhas que há aos montes por aí. Enquanto ela diz que é legal ser devassa, ao fundo aparece ela mesma dançando e se contorcendo em poses provocantes. A cerveja pretende espalhar a devassidão com novas regras de conduta (vide ilustração) e com isso engordar seus cofres às custas dessas meninas. Começou com Paris Hilton e agora é a vez de Sandy. Ser vulgar e devassa é estar na moda? Se Sandy diz que é...
Empinar o bumbum para a câmera agora é moda. Que mensagem uma menina que faz tal pose pensa estar transmitindo? O que pensam essas tolas cabecinhas? E não são apenas tolas cabecinhas. Há meninas que até foram longe em seus estudos e que também posam para a câmera empinando o bumbum, para deleite dos cafajestes de plantão. Sim, porque nenhuma dessas meninas pode esperar um princípe encantado em suas vidas, pode? Temo que engolirão muitos sapos...
Não faço apologia dos contos de fadas e nem sou antiquada em matéria de sexo. Ao contrário, acho que entre quatro paredes tudo é permitido, mas sou contra a mulher que deixa a entender, nas redes sociais, o que pretende fazer entre as quatro paredes. Estará ela ciente da responsabilidade e do risco que poderá enfrentar? Não será isso uma nova forma disfarçada de prostituição?
Sou a favor da mulher livre, bem situada, que luta pelos seus ideais. Sou a favor da mulher séria, que sabe o que quer e não daquela que tem como espelho, unica e exclusivamente, o olhar masculino. Essas mulheres são vítimas fáceis de psicopatas, de homens que só querem usá-las e descartá-las. Sinto-me incomodada com isso e me dá pena ver moças tão lindas prestando-se a tal papel.
Um dos melhores filmes que vi no cinema "As Invasões Barbáras" já prenunciava tristemente para onde se encaminhava nossa civilização - para a barbárie. Não se respeitam mais costumes, regras sociais, respeito a si mesmo e ao próximo, dignidade, amor próprio e amor ao próximo. Tudo isso virou abstrato. Quando se chega a tal ponto, a impressão que temos é de estar vivendo o fim dos tempos. Parece que os bárbaros realmente nos invadiram. Só nos resta rezar e pedir perdão a Deus.
sexta-feira, 11 de março de 2011
Nem só de pão vive o homem
Meio pão e um livro
Em setembro de 1931, o poeta espanhol Federico García Lorca fez o seguinte discurso de inauguração de uma biblioteca em Fuente de Vaqueros (Granada). Convido todos a ler essa pequena jóia.
"Quando alguém vai ao teatro, a um concerto ou uma festa de qualquer tipo que seja, se a festa é de seu agrado, lembra-se imediatamente e lamenta que as pessoas a quem ama não estejam presentes. 'Minha irmã e meu pai iam gostar disso', pensa, e não já não desfruta do espetáculo senão através de uma leve melancolia. Esta é a melancolia que sinto, não pelos meus, porque seria ruim e mesquinho, mas por todas as pessoas que, por falta de meios ou por desgraça não podem gozar do bem supremo da beleza que é vida e bondade, serenidade e paixão.
Por isso, não tenho nunca um livro, porque presenteio todos os que compro, que são infinitos, e por isso me sinto honrado e feliz de inaugurar esta biblioteca da cidade, a primeira seguramente de todo o município de Granada.
Nem só de pão vive o homem. Eu, se tivesse fome e estivesse abandonado na sarjeta não pediria um pão, mas meio pão e um livro. E denuncio aqui com veemência todos os que só falam de reivindicações econômicas, sem falar jamais das reivindicações culturais, que é o que o povo pede aos gritos.
Está bem que todos as pessoas tenham o que comer, mas que também tenham o conhecimento. Que gozem de todos os frutos do espírito humano, porque o contrário é convertê-los em máquinas a serviço do Estado, é convertê-los em escravos de uma terrível organização social.Lastimo muito mais o homem que quer ter o saber e não pode do que um faminto. Porque um faminto pode matar sua fome facilmente com um pedaço de pão ou com algumas frutas, mas o homem que tem a ânsia do saber e não tem meios sofre uma terrível agonia, porque são livros, livros, muitos livros o que necessita e onde eles estão?
Livros! Livros! Eis aqui uma palavra mágica que equivale dizer 'amor, amor', e que os povos deviam pedir como pedem o pão ou como quando anseiam pela chuva para suas plantações. Quando o insigne escrito russo Fiodor Dostoyevsky - muito mais pai da revolução russa do que Lenin -, estava preso na Sibéria, longe do mundo, entre quatro paredes e cercado por desoladas planícies de neve infinita, e pedia socorro por carta a sua distante família, dizia apenas: 'Enviem-me livros, livros, muitos livros para que minha alma não morra!'. Tinha frio e não pedia fogo, tinha uma sede terrível e não pedia água - pedia livros, ou seja, horizontes, ou seja, degraus para subir ao cume do espírito e do coração. Porque a agonia física, biológica, natural de um corpo que tem fome, sede ou frio dura pouco, muito pouco, mas a agonia da alma insatisfeita dura toda a vida.
Já disse o grande Menéndez Pidal, um dos sábios mais verdadeiros da Europa, que o lema da República devia ser: 'Cultura'. Cultura porque só através dela se podem resolver os problemas em que hoje se debate o povo cheio de fé, mas carente de luz.
Nem só de pão vive o homem. Eu, se tivesse fome e estivesse abandonado na sarjeta não pediria um pão, mas meio pão e um livro. E denuncio aqui com veemência todos os que só falam de reivindicações econômicas, sem falar jamais das reivindicações culturais, que é o que o povo pede aos gritos.
Está bem que todos as pessoas tenham o que comer, mas que também tenham o conhecimento. Que gozem de todos os frutos do espírito humano, porque o contrário é convertê-los em máquinas a serviço do Estado, é convertê-los em escravos de uma terrível organização social.Lastimo muito mais o homem que quer ter o saber e não pode do que um faminto. Porque um faminto pode matar sua fome facilmente com um pedaço de pão ou com algumas frutas, mas o homem que tem a ânsia do saber e não tem meios sofre uma terrível agonia, porque são livros, livros, muitos livros o que necessita e onde eles estão?
Livros! Livros! Eis aqui uma palavra mágica que equivale dizer 'amor, amor', e que os povos deviam pedir como pedem o pão ou como quando anseiam pela chuva para suas plantações. Quando o insigne escrito russo Fiodor Dostoyevsky - muito mais pai da revolução russa do que Lenin -, estava preso na Sibéria, longe do mundo, entre quatro paredes e cercado por desoladas planícies de neve infinita, e pedia socorro por carta a sua distante família, dizia apenas: 'Enviem-me livros, livros, muitos livros para que minha alma não morra!'. Tinha frio e não pedia fogo, tinha uma sede terrível e não pedia água - pedia livros, ou seja, horizontes, ou seja, degraus para subir ao cume do espírito e do coração. Porque a agonia física, biológica, natural de um corpo que tem fome, sede ou frio dura pouco, muito pouco, mas a agonia da alma insatisfeita dura toda a vida.
Já disse o grande Menéndez Pidal, um dos sábios mais verdadeiros da Europa, que o lema da República devia ser: 'Cultura'. Cultura porque só através dela se podem resolver os problemas em que hoje se debate o povo cheio de fé, mas carente de luz.
sábado, 26 de fevereiro de 2011
Inveja
Não sei se o que vou dizer aqui é novidade para alguém. Para mim, é, porque até recentemente estive cega.
Muito já se falou sobre o pecado capital que considero o mais grave de todos - a inveja -, mas ninguém ainda mencionou, ou pelo menos nunca li, vi ou ouvi, a inveja que parte das pessoas que supostamente deveriam amar-nos tanto quanto nós a amamos. Pois é, essa inveja existe e é doloroso quando nos damos conta de sua existência. É dificílimo acreditar que alguém tão próximo, tão amado, tão apreciado, tão admirado sinta inveja de nós.
Sei que há coisas demais que não queremos ver - e não vemos. Sei que pode-se passar uma vida inteira sem perceber o que está bem diante de nós. Recusamo-nos a montar as peças do quebra-cabeça para chegar à verdade que vai, com toda certeza, levar-nos a uma terrível decepção e amargura. Vivemos uma cegueira emocional, e não sei se é a melhor assim, porque dói muito ter de enxergar a inveja no rosto querido da pessoa que amamos.
E é justamente essa cegueira que pode nos matar. Um dia, sem mais nem menos, abrimos os olhos ou ouvimos uma frase qualquer que nos soa estranho, quase ininteligível, um comentário aparentemente inocente, um "bom" conselho, uma insinuação, seja lá o que for. Não foi a primeira vez que tal aconteceu. Nesse dia, por um acaso qualquer, estamos mais atentos, mais perceptivos e daí acontece o clique. Bingo!
Mais uma vez, custamos a crer, não queremos pensar, tentamos escamotear a verdade, mas justamente nesse dia, não se sabe por quê, somos obrigados a confrontá-la e já não resta nenhuma dúvida. É ela mesmo, a inveja. E daí, basta relacionar todos os acontecimentos anteriores para chegarmos à conclusão inevitável: a pessoa querida tem inveja de nós. Ao contrário do que supúnhamos, ela não deseja nosso bem-estar, não torce por nós, não está feliz com nossa felicidade. Ela ressente-se do nosso sucesso.
A inveja é irmã gêmea da maldade. Não é doença, como pode parecer. Uma pessoa invejosa vai sendo construída lentamente, desde a infância. O que costumamos encarar como ciúme (e muitas vezes é mesmo) pode ser o âmago da inveja. É dali que ela brota e cresce insidiosamente, nas áreas de sombra, escondida pelos cantos escuros da mente até transformar-se no monstro que vai atormentar nossa existência.
A inveja alimenta-se da nossa boa fé, da nossa inocência e do nosso amor. Não é de espantar que tantos não a vejam e que, por isso mesmo, ela passe a vida inteira despercebida. Até o dia em que abrimos bem os olhos.
quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011
Recordar é viver?
Passei os últimos dois anos me fazendo a mesma pergunta: como aconteceu?
Lembro do acidente diariamente, querendo ou não, e a forma como ele aconteceu sempre foi um mistério. Não conseguia entender e me angustiava esse lapso de memória. Por que não lembrava? O que teria acontecido nesse dia terrível? Sempre fui tão cuidadosa em atravessar uma rua e sempre soube também dos perigos que rondam o trânsito do Rio. Então, por quê?
Hoje de manhã, acordei meio cansada e indisposta. Tinha de ir à hidroginástica, mas não encontrava forças para botar o maiô e ir até lá - uns 10 minutos de caminhada rápida. Busquei uma força dentro de mim, não sei de onde, me arrumei e fui. No meio do caminho, aconteceu: lembrei claramente da noite longa e escura que desabou sobre mim há pouco mais de dois anos.
Eu estava na calçada dando adeus à minha cunhada. O sinal estava fechado e, ao invés de caminhar até a faixa de pedestre, como sempre costumava fazer, atravessei a rua, no meio dos carros, que estavam todos parados. Tinha pressa de chegar em casa e essa pressa quase me levou ao túmulo.
O caminhão estava parado e o motorista, segundo disseram as testemunhas, conversava com o colega do lado. Ele viu o sinal abrir, mas não notou que eu estava atravessando naquele momento. Viu apenas que o carro que estava na frente dele se moveu e fez o mesmo, automaticamente. O caminhão atingiu meu ombro esquerdo e me fez gritar de dor. Lutei para não cair, enquanto o veículo me empurrava. Acabei perdendo o equilibrio e ele passou por cima de mim, causando-me múltiplas fraturas.
Por que estou relatando tudo isso? Por que lembrar de tudo agora depois que dois anos já se passaram? Porque tenho esperança de que esse pesadelo termine de vez. Porque quero virar essa página e seguir adiante com a minha vida. Acho que, enquanto não se faz a catarse, os problemas agarram-se à nossa pele, como sanguessugas, que chupam-nos o sangue, tirando-nos toda a vitalidade.
Só espero, meu Deus, que meus pesadelos e meus medos tenham ido embora. Amém!
Lembro do acidente diariamente, querendo ou não, e a forma como ele aconteceu sempre foi um mistério. Não conseguia entender e me angustiava esse lapso de memória. Por que não lembrava? O que teria acontecido nesse dia terrível? Sempre fui tão cuidadosa em atravessar uma rua e sempre soube também dos perigos que rondam o trânsito do Rio. Então, por quê?
Hoje de manhã, acordei meio cansada e indisposta. Tinha de ir à hidroginástica, mas não encontrava forças para botar o maiô e ir até lá - uns 10 minutos de caminhada rápida. Busquei uma força dentro de mim, não sei de onde, me arrumei e fui. No meio do caminho, aconteceu: lembrei claramente da noite longa e escura que desabou sobre mim há pouco mais de dois anos.
Eu estava na calçada dando adeus à minha cunhada. O sinal estava fechado e, ao invés de caminhar até a faixa de pedestre, como sempre costumava fazer, atravessei a rua, no meio dos carros, que estavam todos parados. Tinha pressa de chegar em casa e essa pressa quase me levou ao túmulo.
O caminhão estava parado e o motorista, segundo disseram as testemunhas, conversava com o colega do lado. Ele viu o sinal abrir, mas não notou que eu estava atravessando naquele momento. Viu apenas que o carro que estava na frente dele se moveu e fez o mesmo, automaticamente. O caminhão atingiu meu ombro esquerdo e me fez gritar de dor. Lutei para não cair, enquanto o veículo me empurrava. Acabei perdendo o equilibrio e ele passou por cima de mim, causando-me múltiplas fraturas.
Por que estou relatando tudo isso? Por que lembrar de tudo agora depois que dois anos já se passaram? Porque tenho esperança de que esse pesadelo termine de vez. Porque quero virar essa página e seguir adiante com a minha vida. Acho que, enquanto não se faz a catarse, os problemas agarram-se à nossa pele, como sanguessugas, que chupam-nos o sangue, tirando-nos toda a vitalidade.
Só espero, meu Deus, que meus pesadelos e meus medos tenham ido embora. Amém!
terça-feira, 8 de fevereiro de 2011
Levar desaforo para casa
Quando criança, minha mãe me dizia que desaforo não se levava para casa. Um mau conselho e a vida me fez entender isso.
Anos mais tarde, em Londres, fui verbalmente agredida por um funcionário do metrô que achou que eu estava tentando embarcar sem pagar o bilhete. Por mera confusão, eu havia entrado numa área onde não podia estar e, ao pedir informação, o funcionário se irritou comigo e me disse de tudo. Frustrada no meu inglês ainda incipiente, acabei levando o desaforo para casa.
Há quase vinte anos (meu Deus como o tempo passa!), conversando com uma colega, reclamava do tratamento indelicado da professora de francês. Por alguma razão, aquela mulher nao simpatizara comigo e não perdia a oportunidade de me ridicularizar diante de todos. A coisa chegou a tal ponto que tive de pedir ao diretor que me transferisse para outra turma.
Mas reclamava eu com a colega, quando esta me contou um caso que lhe acontecera durante uma viagem de férias. Era perto do Natal e o grupo havia decidido fazer o amigo oculto. Na hora de entregar o presente, fazia-se a brincadeira de sempre: meu amigo é alto, simpático... essas coisas. Tocou a minha colega uma mulher que fez, diante de todos, a seguinte descrição dela: minha amiga oculta já é uma mulher passada. A colega enrubesceu e se sentiu, evidentemente, arrasada. Dizia-me ela então: "Foi a última vez que deixei que um comentário de tal natureza me abalasse." E pôs-se então a discorrer sobre a importância de não dar valor às críticas maldosas. Não existia tal coisa como levar-desaforo-para-casa, desde que não se atribuísse importância exagerada a um comentário feito para nos desagradar. Em resumo, não se deve supervalorizar o que não merece sequer ser ouvido ou pensado. Parece simples falando assim, não é? Pois para mim não foi.
Nesses quase vinte anos que se seguiram a essa conversa, deixei muito desaforo onde o encontrei. E para quê, me pergunto agora? Que vantagem tirei, que mérito ganhei? Nem sequer me lembro dos desaforos. Tudo o que sei é que a vida é para ser levada com uma certa leveza. Não se deve levar tudo a ferro e fogo. As pessoas têm o direito de pensar o que quiserem de nós e até expressar seus sentimentos, ainda que desaforadamente. Cabe a nós termos nossa opinião própria de nós mesmos, conhecermo-nos bem e estarmos em paz. Só assim o chamado "desaforo" passa ao largo e deixa de nos atingir. Não é sentir-se soberano ou soberbo - é ter o espírito desarmado.
Viver em paz - essa é a grande lição da vida. Amém!
Anos mais tarde, em Londres, fui verbalmente agredida por um funcionário do metrô que achou que eu estava tentando embarcar sem pagar o bilhete. Por mera confusão, eu havia entrado numa área onde não podia estar e, ao pedir informação, o funcionário se irritou comigo e me disse de tudo. Frustrada no meu inglês ainda incipiente, acabei levando o desaforo para casa.
Há quase vinte anos (meu Deus como o tempo passa!), conversando com uma colega, reclamava do tratamento indelicado da professora de francês. Por alguma razão, aquela mulher nao simpatizara comigo e não perdia a oportunidade de me ridicularizar diante de todos. A coisa chegou a tal ponto que tive de pedir ao diretor que me transferisse para outra turma.
Mas reclamava eu com a colega, quando esta me contou um caso que lhe acontecera durante uma viagem de férias. Era perto do Natal e o grupo havia decidido fazer o amigo oculto. Na hora de entregar o presente, fazia-se a brincadeira de sempre: meu amigo é alto, simpático... essas coisas. Tocou a minha colega uma mulher que fez, diante de todos, a seguinte descrição dela: minha amiga oculta já é uma mulher passada. A colega enrubesceu e se sentiu, evidentemente, arrasada. Dizia-me ela então: "Foi a última vez que deixei que um comentário de tal natureza me abalasse." E pôs-se então a discorrer sobre a importância de não dar valor às críticas maldosas. Não existia tal coisa como levar-desaforo-para-casa, desde que não se atribuísse importância exagerada a um comentário feito para nos desagradar. Em resumo, não se deve supervalorizar o que não merece sequer ser ouvido ou pensado. Parece simples falando assim, não é? Pois para mim não foi.
Nesses quase vinte anos que se seguiram a essa conversa, deixei muito desaforo onde o encontrei. E para quê, me pergunto agora? Que vantagem tirei, que mérito ganhei? Nem sequer me lembro dos desaforos. Tudo o que sei é que a vida é para ser levada com uma certa leveza. Não se deve levar tudo a ferro e fogo. As pessoas têm o direito de pensar o que quiserem de nós e até expressar seus sentimentos, ainda que desaforadamente. Cabe a nós termos nossa opinião própria de nós mesmos, conhecermo-nos bem e estarmos em paz. Só assim o chamado "desaforo" passa ao largo e deixa de nos atingir. Não é sentir-se soberano ou soberbo - é ter o espírito desarmado.
Viver em paz - essa é a grande lição da vida. Amém!
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