terça-feira, 29 de março de 2016

QUALQUER UM, MENOS UMA MULHER

Desde que foi eleita da primeira vez, Dilma enfrenta a misoginia sob vários disfarces. Lembro que recebi na época um e-mail carregado de ódio de uma pessoa que se referia a Dilma como "presidANTA". E foram muitas as pessoas que tentaram desqualiflcar a presidenta, dizendo que esse termo não existia, mas ninguém sabia explicar por que então se usa "parenta", quando eu perguntava. E por aí foi, apesar de Dilma ser uma mulher preparada, uma pessoa fina e elegante.

Mesmo quem gosta de Dilma reconhece sua fraqueza na oratória e o que parece ser agora uma inabilidade política. Tudo indica que Dilma não sabe costurar alianças, administrar conflitos de interesses. Não tem, enfim, jogo de cintura, o que, em última análise quer dizer "fingir que não está vendo". Dilma não transige com os mal feitos e, infelizmente, isso rola solto no Brasil. Difícil é encontrar alguém tão honesto quanto ela.


Ironicamente, apesar de combater a corrupção, os corruptos ganharam força e Dilma está na iminência de ser deposta. É muito triste ver tudo isso acontecer. É muito triste ver mulheres, que deveriam se orgulhar de se verem representadas, serem justamente as que mais atacam Dilma, não pelos erros que ela cometeu, mas pelo simples fato de ser mulher. Inventem o pretexto que quiserem, porque esse ódio, eu me lembro bem, vem desde o dia que ela foi eleita. E são essas ANTAS que preferem o judas Temer a Dilma.
É de chorar.

segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

FICA A DICA - LIVRO "AS MAKIOKAS"

Não me lembro como cheguei ao romancista japonês Junichiro Tanizaki. O fato é que numa das minhas viagens consegui comprar AS MAKIOKAS, a obra prima de Tanizaki, a preço de banana. Não é original o que vou dizer, mas, pra mim, bom escritor é quem consegue manipular com arte as palavras de tal forma a provocar emoções e sensações. Quando digo isso, não posso deixar de lembrar de "Desonra", de J.M. Coetze, ganhador do Nobel de literatura, que me assombra até hoje. A história de AS MAKIOKAS é banal e talvez nem desperte o desejo de leitura de alguns. Está ambientada no Japão pré-Segunda Guerra Mundial. Tsuruko e Sachiko, as duas irmãs mais velhas da tradicional família Makioka de Osaka, estão casadas e precisam casar Yukiko, antes da irmã mais nova, Taeko. E até lá pela página 200 o romance gira em torno dos candidatos à mão de Yukiko, todos minuciosamente investigados e descartados, por não atenderem às exigências da família tradicional. Yukiko, por sua vez, não demonstra a menor pressa, a menor emoção. O leitor chega quase a desanimar do livro, porque é tudo tão anacrônico, tão ultrapassado, mas é justamente este desconforto, essa exasperação que Tanizaki quer causar. Yukiko e Taeko são a metáfora do velho e novo Japão. Enquanto Yukiko é lenta, meditativa e misteriosa, Taeko tem sede de viver, de se emancipar, de ser livre enfim. A partir da página 200 (por aí), o livro adquire tal dinamismo que é impossível largá-lo. Li as últimas 330 páginas bem mais rápido que as 200 primeiras. Recomendo o livro apenas para pessoas tranquilas, que curtem uma boa leitura. É literatura de primeira.

VIDA NA ROÇA - A DELÍCIA E A DOR


Recebi um presentaço da minha amiga AMPLA: essa famigerada empresa de energia elétrica me deixou sem luz desde às 16 horas de ontem. Isso depois de ter ficado sem internet a metade do dia. Bem verdade que caiu um toró, mas falta luz sempre que há qualquer toró. Isso pra mim é incompetência. E quem é incompetente, não se estabelece. Mas naquele açodamento das privatizações, naquela ânsia de deixar o amigo ou o parente bem de situação, escolheram dar a concessão de energia elétrica a um incompetente qualquer nesta Terra Brasilis, que só se dá bem quem é amigo do PSDB. Acabei perdendo a cerimônia do Oscar, sem falar que meus aparelhos domésticos passaram por grande risco.
Mas quem se importa? Na Terra Brasilis se você não é do PSDB pode até acabar indo preso por algo que não fez e nem sabe do que se trata como, por exemplo, uma offshore. O que é mesmo isso, gente?
 

O OVO DA SERPENTE

Na Idade Média, a Igreja, que era o grande poder, arregimentava jovens vagabundos, sem rumo e lhes dava uma causa por que lutar: as Cruzadas. Os jovens eram incentivados a expulsarem os infiéis da Terra Santa e, em troca, ganhavam títulos de nobreza, quando se destacavam. Essa ideia pegou e na contemporaneidade foi adotada, por exemplo, por Hitler, que usou como apelo para a Segunda Grande Guerra a humilhação sofrida pela Alemanha no Armistício de Compiègne (1918), quando, entre outras coisas, o país foi obrigado a pagar pesadas multas de guerra e devolver a Alsácia-Lorena à França. Hitler ainda buscou um bode expiatório do caos no país: os judeus. E aí 6 milhões foram mortos. Vários outros países adotaram a mesma prática e até a aperfeiçoaram, como os Estados Unidos, que mataram nas guerras promovidas mundo a fora gerações inteiras de negros, pobres e hispanos, principalmente. É a chamada limpeza étnica.
Aonde eu quero chegar com isso? É que vem se formando, no mundo inteiro, uma massa de jovens sem rumo e de pouca instrução, vítimas especialmente da mídia, que os manipula ao seu bel-prazer. Ainda na semana passada, fiz um comentário num FB local e, pra minha surpresa e mal-estar, percebi que grande parte dos jovens eram fãs ardorosos do Bolsonaro e o querem para presidente da República. Retirei-me para não polemizar, até porque aprendi que não se deve discutir com fanáticos, mas o pouco que disse foi o bastante para provocar a ira dessa horda de insanos.
Não quero nem pensar no que pode vir daqui pra frente. As únicas soluções que vejo são: mais educação de qualidade e a retirada do poder absoluto da mídia em nosso país, concentrada nas mãos de poucas famílias, que usam o poder concedido pelo povo em benefício próprio.
Fora isso, repito o que disse a marquesa de Pompadour: "après nous, le déluge" (depois de nós, o dilúvio).

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

VIDA NA ROÇA


O verão na serra tem sido o mais ameno, desde que cheguei aqui. O dia amanhece devagar, com um sol meio preguiçoso, deixando poucas horas para o banho de sol, porque depois ele queima de verdade. Ao meio-dia, não me atrevo a ir lá fora. Mas lá pelas três da tarde, a gente começa a ouvir umas trovoadas ao longe. Elas me fazem lembrar das trovoadas dos verões da minha infância e dos banhos de chuva refrescantes.Quem nunca tomou banho de chuva no verão não sabe o que é felicidade verdadeira. Minha mãe dizia que as trovoadas eram a voz zangada de Deus e que Ele estava brigando comigo. Eu era muito levada, como são as crianças, mas o que mais aborrecia minha mãe é que eu era também malcriada e respondona, como dizia. Aliás, um defeito que ela mesma me passou. Mas Deus, claro, só se zangava comigo. E eu ficava quietinha, tentando me emendar, mas isso nunca aconteceu, até não muito tempo atrás, quando comecei a ficar realmente cansada das pessoas. Hoje em dia, só sou malcriada e respondona com aquelas que eu gosto. Com as outras, meu silêncio.

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

VIDA NA ROÇA – DEUS AJUDA QUEM CEDO MADRUGA



Ainda era cedo quando Brownie começou a se agitar. Olhei o relógio. Eram 5h e lá fora a passarada já começara a cantar. Ninguém gosta mais do amanhecer do que os pássaros, ficam loucos de alegria. Larguei o livro, os óculos e abri a porta que dá para o jardim. O que vi, me fez voltar, pegar um casaco e me sentar lá fora. A Lua e a Estrela da Manhã ainda brilhavam num céu muito azul, rasgado de nuvens levemente rosadas. Ao longe, nas montanhas, repousavam algumas nuvens acinzentadas que aos poucos cediam ao rosa e, mais atrás, um tom alaranjado se insinuava.  Fiquei ali observando e tiritando de frio, devia ter posto um casaco mais quentinho. Enquanto apreciava o espetáculo, as luzes da Lua e da Estrela da Manhã foram lentamente se apagando. Era o sol chegando e mudando as cores do céu. O forte alaranjado suavizou-se até se tornar amarelo, mas à medida que o sol avançava as nuvens se douravam e culminaram por apagar de vez o prateado do planeta e do satélite. Senti sua falta, Dani, que com as lentes de sua câmera teria captado toda a beleza que palidamente descrevo.

terça-feira, 22 de setembro de 2015

A PROVA DE FOGO


Sei que muita gente - e o mais incrível: muitas mulheres - ficará feliz se Dilma sofrer impeachment ou se vir forçada a renunciar. Hoje à noite, a turma do quanto pior, melhor vai fazer a presidenta passar por uma prova de fogo. Não há motivo nenhum para soltar foguete ou festejar se tal acontecer.

Foi a primeira vez que tivemos uma presidenta. O que devia ser motivo de orgulho é razão de escárnio. Cristina Kirchner e Michelle Bachelet têm sorte de viverem em países civilizados. Vejo alguns amigos argentinos insatisfeitos, mas nenhum desrespeitoso.


Dilma Rousseff foi perseguida desde o início, quando escolheu ser chamada "presidenta". Montes de linguistas fajutos, de última hora, saíram do anonimato para condenar a escolha - a maioria mulheres, pasmem! E as maldosas de plantão rimaram com "anta". Vários linguistas sérios a quem consultei confirmam a correção do vocábulo, mas até hoje ainda insistem em dizer que está errado. Errado mesmo é a baixa autoestima de muitas mulheres, um monte delas. Me decepcionei muito com algumas que julgava esclarecidas, sensatas, racionais. Foram as mais raivosas, as mais preconceituosas, as mais irracionais. Algumas se revelaram tão machistas que deixaram de lado a educação (se é que alguma vez a tiveram) e chamaram a presidenta de "vagabunda" nas redes sociais. Muitas encheram a boca para gritar VTNC em plena arena esportiva, numa solenidade, quando Dilma estava acompanhada de autoridades, humilhando-a, sem se darem conta que, ao mesmo tempo, davam a si mesmas diploma de bestas humanas. Foi uma vergonha que cruzou fronteiras e mostrou ao mundo o povo inculto e incivilizado que vive neste país. Não hesitaram em dirigir impropérios a uma mulher digna, que é mãe e avó, sem perceberem que as ofensas e as humilhações se voltavam contra elas mesmas, para delírio dos machos a quem chamam de maridos e filhos. 


Agora entendo porque se matam tantas mulheres no país, pois se nas classes mais abastadas elas não se respeitam, se sofrem de tanta baixa estima, imagino como deve ser nas classes inferiores. E se for negra e pobre é bem pior.


A eleição da Dilma Rousseff abriu meus olhos para o país onde vivo. E o que vi me deixou profundamente desgostosa e triste. Tem razão Lévi-Strauss: tristes trópicos.

O CLIMA DO ANO

Há tempos venho notando que a natureza absorve nossos humores, mas isso é assunto pra outro post. Lembro que, em 2016, meu pé de amora fic...