quarta-feira, 8 de novembro de 2017

UM NATAL CHEIO DE TRAUMAS

Atenção: o assunto que vou abordar é espinhoso e triste. Não leia se não estiver preparada (o).

Conheço duas mulheres vítimas de abuso sexual. E os dois casos aconteceram em família, corroborando a pesquisa do Ipea: "70% dos estupros são cometidos por parentes, namorados ou amigos/conhecidos da vítima, o que indica que o principal inimigo está dentro de casa e que a violência, muitas vezes, ocorre dentro dos lares." É o caso da amiga que chamarei de "O". Convidada por ela, certa vez, viajei com minhas filhas para passarmos o Natal juntas. "O" tem muitos irmãos e uma família enorme. Tudo corria bem no clima natalino até a chegada de um dos cunhados de "O". Eu não sabia da história, mas foi impossível não perceber a transformação por que passou minha amiga. De alegre e descontraída, ficou nervosa e seus olhos cintilavam de ódio e medo. Ficou transtornada. E foi então que eu soube, depois da festa, que o cunhado havia abusado dela, quando criança. Contou-me em poucas palavras, com o olhar distante e triste, e interrompeu o relato abruptamente. Meu coração sangrou por ela. 


O segundo caso, mais grave, também aconteceu no Natal. Uma amiga, que chamarei "P", me convidou e lá fui eu com minhas meninas. Fizemos juntas a ceia e montamos a mesa. Estávamos na sobremesa quando a campainha tocou. Nervosa, "P" deu um salto da cadeira e foi abrir a porta, hesitante e de ombros baixos. Eram os pais dela. Notei o pavor, o terror, o medo descontrolado resvalando para a quase loucura nos olhos dela. Foi aí que o Natal desandou, sentia-se o clima pesado no ar, até que finalmente os pais foram embora. Foram lá desejar um "feliz Natal" à filha e à neta. Era chegada a hora de voltar para minha casa, mas antes de sair, minha amiga me contou ter sofrido abuso sexual do pai desde a infância, com a total indiferença da mãe, para meu horror e incredulidade. Naquele tempo, eu ainda tinha muita fé nas pessoas. A história da amiga também corrobora a pesquisa do Ipea: "24,1% dos agressores das crianças são os próprios pais ou padrastos, e 32,2% são amigos ou conhecidos da vítima."


Por isso, Natal para mim é um dia muito triste, porque posso imaginar os milhões de meninas e meninos e dos adultos, que sofrem até hoje porque tiveram suas infâncias roubadas e seus corpos violados numa data em que, ironicamente, se comemora, no mundo inteiro, o nascimento de uma criança - o menino Jesus.

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