sexta-feira, 20 de agosto de 2010

O Corpo como Metáfora - O corpo aprisionado

“Nenhum animal transforma voluntariamente, como o homem, o seu próprio corpo: extraindo os dentes, amputando os membros, perfurando os órgãos, derramando o sangue, deformando o crânio”
("Tabu do Corpo", José Carlos Rodrigues)



Os séculos XII e XIII privilegiavam a magreza e a verticalidade. A roupa, bem colada ao corpo e talhada de maneira a alongar a silhueta, faziam as mulheres se assemelharem às finas colunas góticas. O fim da Idade Média libera as amarras do corpo: ombros, cabelos e parte dos seios podiam ser mostrados. No século XV, porém, uma espécie de colete muito justo voltava a comprimir o busto. A ênfase do vestuário concentrou-se no ventre, que devia ser proeminente e evocar a fertilidade. Para alcançar esse efeito, as mulheres usavam uma bolsa estofada sob a roupa.


No final do Renascimento, as roupas eram escuras e rígidas. Os seios espremidos, os quadris apagados, os ventres salientes e as linhas sinuosas da Idade Média deram lugar à roupa folgada, que escondia a silhueta. A vestimenta devia salientar a retidão, a altivez, as qualidades da alma. Era uma época de incertezas e turbulências provocadas pelas tensões religiosas entre católicos e protestantes. Na era elizabetana, o corpo feminino estava totalmente coberto. A substância predominava sobre a matéria. Esse estilo prevaleceu até meados do século XVII (período Barroco).

O início do século XVIII trouxe um certo relaxamento ao corpo. As roupas pesadas, o colarinho duro e os babados do Barroco cederam lugar às roupas que acompanhavam as linhas do corpo, dando destaque à suavidade, beleza e ao aspecto delicado. O período neoclássico marcou a volta da simplicidade do traje e o conforto passou a predominar sobre a ostentação. Na virada do século XIX, a moda feminina voltou ao estilo de alguns séculos atrás. Na época de Jane Austen, o traje feminino evocava lembranças dos séculos XVI e XVII.

Nos primórdios do século XX, o corpo bem nutrido e carnudo evidenciava abundância e prosperidade material. A estética da época privilegiava a textura, a tangibilidade e a massa. Substância e textura eram características da moda feminina: bonecas francesas, em versão miniaturizada, vestiam o último lançamento da haute couture. Cada dobradura do tecido, cada enfeite, cada aspecto que compunha a sua confecção eram um tributo à tangibilidade.

Por volta de 1920, porém, um aspecto mais moderno sugeria a transmigração da matéria, a libertação da substância de sua forma. Desde a década de 60 o corpo ideal vem cada vez mais se afinando: as curvas voluptuosas de Marilyn Monroe foram-se achatando até chegarem ao corpo retilíneo, quase etéreo, de Twiggy. Em 1979, Raymond Loewy, um dos maiores designers industriais, observava a tendência do ultra-esbelto também na arquitetura automobilística e introduziu o intaglio (superfície comprimida) na confecção do Starliner, da Studebaker. Ao final da obra, comentou o resultado: “quis dar ao Starliner um aspecto magro e faminto".

Nenhum comentário:

O CLIMA DO ANO

Há tempos venho notando que a natureza absorve nossos humores, mas isso é assunto pra outro post. Lembro que, em 2016, meu pé de amora fic...